sexta-feira, 21 de maio de 2010

Minhas Memórias


Minhas memórias... Se me lembro bem, começaram assim, certa vez...
Através de um grande sonho, vim parar aqui, largando tudo e todos, amigos, família (em parte porque tenho uma irmã a qual me acolheu e por ela estou neste lugar), casa, um cantinho só meu onde cada objeto tinha o seu devido lugar... Um namorado ou pior, agora ex-namorado.
Quando se é jovem, chama-se a idade das rosas, pois bem eu me lembro só de espinhos.
Bem nova fui casar, perdi meus pais por doenças incuráveis, soluços maus entalados, dores jamais esquecidas, lembranças do hospital sempre são contidas. O aperto no coração até hoje me consome, o que me resta a fazer olhar para rente e vamos. A pior idade para se ficar órfão é na adolescência, quatorze anos e sem saber o que fazer para onde ir e com quem ficar. Minha irmã me estendeu a mão, mas por pouco tempo, segui então os últimos conselhos de minha amada mãe e pro altar fui dizer o sim.
Este durou dez anos, o tempo que é para ser. Entre apertos e aceitação consegui concluir o Ensino Médio. O gosto por estudar sempre foi grande, sentia que um pouco de minha mãe estava em mim – Eu sou ela em mim – Fui fazer o magistério em outra cidade.
Essa época foi de grande aprendizado, cresci, comecei a falar mais, a não ser mais aquela menina que passou o Ensino Fundamental toda calada, aos pouco fui conhecendo o Mundo!
Professoras maravilhosas mostravam caminhos que poderiam ser trilhados, possibilidades de um entendimento para uma prática mais agradável. E cada vez mais me reconhecia como um ser entre os seres.
Cansada de humilhações, espezinhada pela vida e agora não tão menina, decidi abraçar a vida real e sair do aconchego de um lar, de uma década.
Neste tempo, já havia terminado o magistério e começado a faculdade de letras. Novos horizontes, novos saberes, novas vidas. É tão maravilhosa a troca de vivências, não só conteúdos, mas de vidas cada qual com seus problemas, suas inquietações e toda essa bagagem vai dando um suporte para a sua própria caminhada.
Já trabalhava com crianças o tempo em que minha mãe era viva, profissionalmente comecei pelo magistério, nos tapas-furo de uma escola, de outra e outra, um dia, uma semana, um mês... Até conseguir o raro, entrar numa empresa famosa, de renome. Dentre os vários testes, consegui entrar nessa fortaleza da qual jamais sonhara em conseguir.
Nossa que dias maravilhosos, brincar com meus bebês, dar banhos, conversar com eles, cantar e pular, levá-los ao parque, ao Hall... Dos trabalhinhos que as professoras tinham que enfeitar a creche toda e como era enorme... Dos serões de virar a noite e passar comendo sorvete e chocolate com as colegas e rindo das histórias de nossas vidas mesmo. Das fugidas da hora da janta aonde íamos correndo ao mercado ou à padaria para extasiar-nos com doces e mais doces.
É... A crise calçadista nos afetou também e fui parar numa outra creche, particular do centro, o bom que continuei com meus bebês, meu maternal um, cantar pular, levá-los para passear pela calçada, brigar com a chefa em defesa deles, eles me derrubando na piscina, justamente quando eu não tinha outra roupa e precisava sair para outro lugar depois. Como não sou de brigas e eu e a dona não estávamos indo nada bem, saí. Fui trabalhar numa empresa de calçados, na produção.
A vida dá voltas, numa brincadeira “inocente” algo que era para ser um sonho, se tornou um pesadelo, dez anos casada, dez anos de tratamento e Deus não quis que eu desse fruto. E justo num descuido proposital e despreocupado, gerei o que achava que nunca conseguiria.
A depressão foi tomando tamanha proporção, que eu não conseguia me reconhecer... Lembro-me de brigar com as pessoas, gritava porque não queria que ninguém chegasse perto de mim, só eu sabia que meu feto não nasceria com vida, uma fúria inundava meu ser. Lutei contra os médicos para não levar adiante e em lembro que não foi fácil, vendi meu carro, alguns móveis e fui para o hospital. Minha tia ficou lá na sala de espera, passei o dia inteiro na sala de cirurgia... Passa-me, hoje ainda cenas na memória, dopada, via vultos de situações, dos corredores brancos, de luzes, vultos de enfermeiros me chacoalhando, me perguntando se estavam bem ou para voltar em mim. Essa dor carreguei por meses em mim...
Passada a quarentena em cuidados de minha tia, saí de minha terra, atravessei os domínios políticos chegando a esse estado em busca de um novo recomeço.
Rapidamente, consegui trabalhar numa creche, CEJU, lembro que era o terceiro dia meu na cidade quando fui designada para lá, achei que não conseguiria “bebês”? E eu saindo de uma quarentena forçada? Fui, e justamente neste lugar, entre lágrimas e alegrias, me recuperei, abrandando um pouco o fardo da vida.
A duras penas, transferi minha faculdade, foi difícil a aceitação, só uma e longe. Não gostei dela, dos professores. Lá era bem melhor... Aqueles sábados inteiros eram chimarrões para cá e para lá, os professores eram próximos a nós... Fazer o que, o que me resta é realizar um único sonho, ser professora, lutar para melhorar. É porque no amor...
No ano seguinte, um susto, em vez da creche, uma sala de aula, 5° e 6°. Nossa!Não sabia se conseguiria, mas é para isso que estou estudando e aceitei.
Sempre damos o nosso melhor e depois de algum tempo percebemos que era pouco, mas o bom é estar entre os alunos e perceber que você pode errar e acertar, um aluno escreveu-me que os conteúdos ele poderia esquecer, mas a convivência minha com eles não, e é esse carinho que levo comigo, cada cartinha, flor ou fruta, o mais simples e singelo, eu fico feliz.
Esses dias atrás, ganhei um apito, aqueles de assoprar e a bolinha fica suspensa no ar, pensei comigo, o que vou fazer com isso? Mas, com um sorriso no rosto e um beijo na face da menina, agradeci, pois seus olhos miravam as expressões, os seus olhos seguiam os meus movimentos, os seus olhos ainda seguem os meus olhos...
Esses dias, de aniversário ganhei da turma uma tiras, pedaços de papel enrolados, cada um fez conforme uma colega ensinou e todos tentaram o seu melhor para ficar bonito.
Achei engraçado quando esses dias ganhei umas goiabas, hoje ganho abacate, caqui, mas recordando eu também já levei para a escola, no meu tempo, as abacates...
Sabe, é isto que me faz seguir a vida, com minha casinha agora de aluguel e não mais minha, poder entrar no portão da escola e ser recebida com beijos e claro, às vezes aquela fofoca de intrigas e coisa e tal. Ma o bom , o bom mesmo é sentir que o sonho é aquele que você se esforça, luta e vive ele. Sabe o que deu força para lutar? Li uma mensagem que dizia que “o sonho é uma conquista do dia-a-dia e não uma ilusão de quem sabe sonhar” e outra, “Não desanime pois, o sol dá um espetáculo cada manhã, enquanto a sua platéia continua dormindo”.

Curso Diversidade Textual: os gêneros na sala de aula
Autora: Vani Lucia Brand
Formadora: Graziela Alves

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